
Quem imaginaria que um dia em sua vida sentiria falta de uma simples escova de cabelos? A Amanda, com certeza, não imaginaria isso. Não até decidir mudar a sua vida completamente e recomeçar do outro lado do mundo.
Mas, naquela manhã, enquanto o vento quente de Malta batia contra as pedras antigas da rua onde mora, ela se pegou olhando para o espelho e pensando na sua velha escova. Uma dessas simples, de plástico, que sempre ficava na gaveta do banheiro, pronta para ser usada a qualquer momento.
A escova de cabelo nunca teve grande importância até aquele instante, até perceber que, há quase seis meses, estava longe dela. E, por mais simples que fosse, a saudade estava ali, tão concreta quanto o reflexo no espelho.
O começo da história
Amanda optou pela vida em Malta para estudar, mas nunca imaginou que o desafio seria tão grande. Ela sempre havia sonhado morar fora, explorar novos horizontes e respirar uma vida diferente.
O que ela não previa, na verdade, era o peso invisível da distância. A saudade estava se tornando algo que ela não reconhecia mais, mas que lutava para disfarçar através do encantamento que sentia pela cidade, que já admirava muito antes de se mudar.
As ruas de Valeta, que é a capital de Malta, com suas fachadas desgastadas pelo tempo, pareciam ter saído de um filme. O céu bem azul e o mar imenso ao redor transmitiam leveza, como se o mundo fosse uma tela em branco. Mas logo os encantos foram dando lugar a um vazio profundo. No começo, ela não percebeu a transição, mas a rotina foi ganhando um tom cinza e aquele prazer da novidade começou a se diluir.
Lidando com a nova vida
Sua mãe, Cláudia, ligava quase todos os dias. Porém, mesmo assim, aquela voz doce e protetora, estava se tornando cada vez mais distante. Amanda já não sabia mais como contar o que sentia.
— Mãe, está tudo bem. Não se preocupe!
Era mentira. Quando dizia isso, ela só estava tentando manter a calma, tentando fazer com que todos, especialmente Cláudia, acreditassem que a saudade não estava sendo tão complicada. Mas, ao colocar o telefone no gancho, sentia o peso do silêncio em seu apartamento vazio e solitário.
Dia após dia, Amanda tentava se adaptar ao ritmo da vida em Malta. Aprender inglês, fazer amigos e entender o comportamento das pessoas era muito mais difícil do que ela tinha imaginado antes de se mudar.
As pequenas interações cotidianas, aquelas que antes passavam despercebidas, agora se tornavam um desafio. Nos comércios, por exemplo, sempre pensava duas vezes antes de pedir algo, pois sentia um nó na garganta e um enorme receio de ser julgada.
E haviam também os olhares curiosos. Segundo ela, não eram hostis, mas, com o tempo, começaram a pesar. Quando alguém em Malta olhava para ela com aquele olhar curioso, ela não sabia se era por ser brasileira ou por ser estrangeira, um conceito um pouco confuso em seu coração.
Era uma sensação de que sempre havia algo que ela não conseguia entender completamente, algo que ficava sem explicação.
Um dia, uma amiga de classe a convidou para tomar café com um grupo de estudantes. Ela sorriu e tentou esconder o desconforto. Queria muito dizer sim, mas sabia que seria uma conversa sem naturalidade, uma experiência que exigiria mais energia do que ela estava disposta a gastar naquele momento. As palavras pareciam se embolar em sua língua e o medo de não ser compreendida totalmente a fez preferir a solidão.
A saudade de casa e de sua família, se tornou constante. Seu pai, Eduardo, sempre tão presente, com aquele olhar protetor, lhe dizia para seguir o seu sonho, que tudo valeria a pena no fim.
Mas no fundo, Amanda sabia que a presença deles representava uma falta que ela não conseguia expressar.
Lidando com a saudade
Em uma bela noite, Amanda decidiu caminhar por Valeta. O passeio, antes uma fuga para o encantamento, se transformou em uma busca. Ela sentia uma grande pressão em seu peito, como se o local diante dela não fosse mais uma promessa, mas um espaço vazio.
A saudade, enfim, havia tomado forma. Mas, ao cruzar uma pequena praça, viu uma cena que a fez parar. Uma mulher, sentada em um pano na grama, falava animadamente com a filha, que estava ao seu lado. Não parecia ser uma conversa qualquer. A mulher gesticulava com paixão e o sorriso da criança era puro e sincero.
Amanda ficou parada, observando e uma onda de emoções tomou conta de seu corpo. Lágrimas escorreram pelo seu rosto sem que ela percebesse. E ela começou a chorar copiosamente.
Foi então que a mulher a viu e, com um sorriso generoso, acenou para que se aproximasse. Amanda pensou em não aceitar o convite, mas a energia entres as duas era mesmo contagiante.
Então, se sentou ao lado daquela mulher e um silêncio absoluto se instalou entre elas. Não era necessário falar para que o entendimento acontecesse. A mulher, ao perceber o olhar de Amanda, perguntou suavemente:
— Você está longe de casa, não é?
Amanda respirou fundo e, pela primeira vez desde que chegou a Malta, se sentiu compreendida sem precisar justificar a sua dor.
— Sim. A saudade é difícil, sabe? – disse, tentando encontrar palavras para explicar algo que parecia indescritível.
A mulher sorriu e estendeu a mão.
— Às vezes, a saudade pode ser mais fácil de carregar quando a gente compartilha com alguém.
Amanda sorriu. Aquele gesto era simples, mas naquele momento foi muito valioso. Era um lembrete de que, mesmo em lugares distantes, havia sempre alguém disposto a oferecer apoio.
Dessa forma, nasceu sua primeira grande amizade desde que optou por levar a vida em Malta. E realmente, sua amiga Thay tinha toda razão, a saudade se tornava mais leve quando dividida.
Aprendendo a morar em Malta, com uma nova visão
Assim, Amanda começou a perceber algo novo: aquela cidade, que antes parecia tão distante e desconhecida, começava a se transformar em um lugar mais acolhedor e mais próximo.
Com o tempo, compreendeu que o que buscava ao se mudar para Malta não era apenas conhecer um idioma novo, mas conhecer várias faces da verdadeira mulher que estava se tornando.
Ela aprendeu que a saudade não era um obstáculo a ser vencido, mas um elo que a conectava com tudo o que amava, tornando-a mais forte e mais aberta ao novo.
E assim, ao lado de sua nova amiga, Amanda descobriu que o amor e a amizade podem florescer até nos lugares mais inesperados, mostrando que mesmo longe, é sempre possível se sentir em casa.