
Desde muito pequena, Júlia imaginava a vida na Itália. Enquanto as outras crianças pediam brinquedos ou livros de colorir, ela pedia à mãe que a deixasse ajudá-la na cozinha.
Era uma paixão inexplicável por temperos e sabores e uma curiosidade que fazia aquela menina comprar revistas de receita e passar horas lendo, como se não houvesse mais nada ao seu redor.
Cresceu rodeada pelo cheiro de alho, cebola e manjericão, entre colheres de pau e panelas que não cabiam nas mãos de uma menina que sempre amou cozinhar.
Mais tarde, quando decidiu cursar gastronomia, Júlia sabia que seu destino estava traçado: um dia, partiria para a Itália e aprenderia o que sempre quis saber sobre a culinária que tanto amava.
E ela foi persistente. Passou anos trabalhando em restaurantes, economizando e planejando a viagem dos sonhos. No entanto, havia um laço que parecia segurá-la: sua irmã, Clara.
Três anos mais velha, Clara era seu porto seguro. Elas dividiam não só o quarto e as roupas, mas os segredos, as angústias e os planos para o futuro.
A cada vitória de Júlia, era Clara quem comemorava primeiro. E a cada tropeço, era a sua irmã quem estendia a mão para levantá-la. Estar longe dela era a única parte do plano que não fazia sentido.
Mas o dia chegou. Júlia conseguiu um emprego em uma pequena trattoria no interior da Toscana e foi viver seu plano mais duradouro.
Foi com medo mesmo e com uma bagagem cheia de lembranças para, sempre que possível, se sentir em casa.
A vida na Itália
O trabalho era em um restaurante familiar com paredes de pedra e mesas de madeira, onde o tempo parecia passar mais devagar. Os novos colegas eram simpáticos e conversavam muito alto.
No começo, a emoção de estar finalmente ali fazia tudo parecer fácil. As manhãs eram preenchidas com idas ao mercado, onde ela se perdia no tempo de tanto admirar cada traço daquela cultura.
A saudade veio de mansinho, em detalhes que Júlia não percebeu de imediato. Nos primeiros dias, estava tão encantada com tudo que não notava o vazio deixado pela irmã. Mas, aos poucos, cada novo prato que experimentava, cada receita que aprendia, parecia um momento incompleto.
Quando fazia um molho especialmente bom, seu primeiro pensamento era: a Clara precisava provar isso!
E quando saía para explorar as ruas de pedra e as praças iluminadas, sentia falta da presença da irmã ao seu lado e do braço entrelaçado ao dela enquanto descobriam novos lugares juntas.
Nas ligações de vídeo, Júlia tentava disfarçar. Contava para Clara sobre a vida na Itália, os pratos, sobre os novos amigos, sobre os vinhos locais que ela nunca havia sonhado que provaria.
No entanto, a saudade continuava apertando seu peito e foi o amor pela irmã que a fez continuar. Afinal, ela era sua maior incentivadora e admiradora, e as duas tinham prometido viver a vida que cada uma sempre sonhou.
A da Clara no Brasil e a da Júlia na Itália, como nos sonhos daquela menina que cozinhava desde tão pequenininha.
E agora tinha a oportunidade de cozinhar sua culinária preferida, rodeada da cultura que tanto admirava.
Então, embalada por festivais culturais, pinturas e muita gastronomia, ela foi criando a sua nova realidade que tinha uma pitada de infância com gostinho de futuro.
Assim, ela seguiu sua vida, cuidou de si, se apaixonou, desapaixonou e quer se apaixonar de novo.
Afinal, se permite viver todos os sabores que a sua vida tem para oferecer.
Mesmo os mais amargos, como os desafios de se sentir sozinha fora do país e a saudade da irmã, que felizmente pode ser amenizada, já que elas realizam anualmente uma viagem juntas.
Aliás, isso se repetiu algumas vezes e continua se repetindo, com uma irmã visitando a outra, mas cada uma vivendo o seu sonho.
A vida na Itália vai muito bem, obrigada!